segunda-feira, 1 de abril de 2013

A língua esculhambada
Gramática ouropéica
Este é um artigo contestador
Não deve ser usado pra concurso, vestibular, etc.
Respondendo a uma colega, sobre a grafia de proteico eu disse que não deve levar acento, porque vem de proteína, assim como meiga, que vem de meiguice, e não como onomatopéica, que vem de onomatopéia. E assim concluí dizendo que as regras gramaticais são uma barafunda infernal, onde cada autor impõe seu estilo e se contradizem mutuamente, mesmo auto-contradizem.
— Então qual estilo se deve adotar numa prova?
— Tem de descobrir qual o estilo dos corretores das provas.
Desde criança aprendemos a expressão Entrega a domicílio. Mas recentemente algum asno decidiu que o correto é Entrega em domicílio. Esse é um exemplo cabal de que no reino gramatical reina o modismo, o estilo, o preciosismo exacerbado. Mesmo em castelhano o termo é a domicilio.
Esmiucemos a expressão: Alguém comprou numa loja e aguarda a entrega a ser feita por um funcionário dessa loja. O funcionário levará a mercadoria da loja até a casa do cliente. Não usará a casa do cliente como ponto de entrega. Então é entrega até domicílio = entrega a domicílio.
Se a loja fará entrega em domicílio, significa que há um domicílio onde a mercadoria será entregue. Então o cliente deverá ir até esse domicílio pra retirar a mercadoria.
Pode haver caso em que ambas são corretas: Quando o cliente pode retirar a mercadoria em domicílio mas também pode optar receber em casa.
Se o entregador põe tudo na carroceria duma camionete e ali faz entrega aos que chegam pra receber, é uma entrega em camionete, em carroceria, como queiras.
Ao contrário, se o funcionário entrega a recebedores que estão aguardando na carroceria de camionete, é entrega a camionete.
Se o entregador entrega, na carroceria de sua camionete, a outras camionetes, ambas as formas estão corretas: A entrega é a camionete e em camionete.
Alguém pode argumentar que quando o entregador leva a mercadoria ao domicílio mas não entra, entregando no lado de fora da porta, é entrega a domicílio, mas se entra, entregando dentro da casa, é entrega em domicílio. Tudo bem. Mas não precisamos exagerar na exatidão. Eu diria que de qualquer forma é entrega a domicílio, pois foi levada da loja até o domicílio. Pois o objetivo é o transporte da loja ao domicílio e não estabelecer um ponto de entrega num domicílio.
Há alguns anos vi um literato da academia brasileira de letra ser entrevistado no Jô Soares 11,5. Disse que pagamento a vista tem de ter crase porque é feito diante da vista (!?) e que outra regra é inverter o gênero pra ver se surge o ao. Mas ali estava se contradizendo, porque ao se fazer o teste invertendo o gênero: É pagamento a prazo e não ao prazo, portanto pagamento a vista e não à vista. Porque o pagamento a prazo também é feito diante da vista!
É diferente da expressão náutica Terra à vista! Basta inverter o gênero pra se certificar: Terra ao largo.
Infelizmente é enorme o estrago que uma entrevista desastrada assim faz na cultura popular, por se tratar de programa de enorme audiência. Basta ver os anúncios de venda pra ver esse estrago.
Dois exemplos suficientes pra demonstrar que é mais um problema de falta de inteligência que de falta de cultura.
Outra pérola da mesma sumidade foi dizer que a esdrúxula expressão juniores se sente obrigado a aceitar. Ora, tanto a júnior quanto a seu antônimo sênior se aplica a regra do plural de lápis, que é lápis e não lapises. O plural de júnior é júnior, e de sênior é sênior. Não há seniores, meus senhores! Assim como o masculino de donzela é donzel e não donzelo, e o de dona é dom e não seu.
Caramba! O dicionário do word reconhece donzelo e não donzel! É de lascar!
Já que o mencionei, que horror isso de colocar barbarismo no dicionário? William, York, Windsor... Isso são palavras aceitáveis num dicionário de português?
Infelizmente a maioria da humanidade ainda prefere o comodismo de seguir a opinião dum guru, pra não ter de pensar. Assim se prendem a estereótipos, como numa página onde a autora aconselhava o que dar de presente ao namorado. Disse que bombom não, a menos que seja um Ferreiro Rocher. Ferreiro Rocher? O pessoal acha que é chique? Quando ganhei uns achei uma porcaria, muito amendoim. Qualquer sonho de valsa é muito melhor.
Assim vemos uma gramática que parece ouro mas é ouropel, cheia de purismo, preciosismo, maneirismo, firula, esnobismo, sofisma
Veremos mais capítulos sobre essa gramática de polichinelo.

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