Relatório 11
do
emissário extraordinário, enviado espæcial XYZ ao planeta 3
Em missão urgente buscando inteligência
a dom Piqwỹ Lagarrr Urraur nã-Ữluarurr
governador-geral do sistema
Altair
Os nativos do
planeta 3 são mesmo engraçados. Acreditam piamente que nalgum lugar no céu, que
não sabem onde, existe um velhinho de barba branca onipotente, onipresente e
onisciente, que criou a tudo, e a quem vivem puxando o saco todo domingo. Na falta
dum nome o chamam Deus, mas que seria muito bonzinho mas também terrível. Segundo
os planeta3enses esse velhinho castiga os maus e premia os bons.
Às crianças
reservaram outro velhinho de barba branca, gorducho e bonachão, chamado Papai
Noel, não tão estapafúrdio mas com superpoderes suficientemente absurdos pra viajar
num trenó voador puxado por renas e visitar cada criança boazinha, entrando na
chaminé da casa e deixando um brinquedo numa meia pendurada na parede. Como consegue
visitar bilhões de crianças numa noite ninguém explica.
Os adultos,
que criaram Papai Noel, riem do fato das crianças acreditarem que existe, mas
as crianças não podem rir dos adultos crendo no outro velhinho, ainda mais estapafúrdio,
pois levariam tabefe.
Os adultos
também acham graça das brincadeiras das crianças mas não acham graça quando
alguém ri das brincadeiras dos adultos. As crianças parecem ser bem mais
sensatas, pois encaram a brincadeira como brincadeira mesmo e sabem usar o
faz-de-conta, enquanto os adultos chegam a ter ataque cardíaco torcendo por um
bando de marmanjo correndo atrás duma bola, com objetivo de a fazer passar uma
linha e balançar a rede. E encaram essa atividade com a maior seriedade, como
se fosse coisa muito importante. Até gera mais dinheiro e discussão que arte e
literatura!
Ainda mais que
as crianças precisam da brincadeira pra desenvolver o cérebro em formação,
enquanto os adultos, que não precisam mais disso, a deveriam ter como mero
lazer.
Quando cresce,
o indivíduo esquece que foi criança e fica ranzinza. Assim, em vez de desfrutar
a vida se ofende com tudo e leva tudo a sério demais e não existe momento pra
descontração, a não ser quando bebe.
A avareza
tomou conta de sua personalidade. Por isso quando as crianças vão desembrulhar
um presente não a deixam se divertir abrindo o pacote, porque querem reaproveitar
o papel-de-presente pra fazer embrulho no natal do ano seguinte.
Em todo fim de
ano as empresas fazem festim de confraternização, que seria a ocasião em que os
que não conviveram no trabalho se conheçam, interajam. Mas na prática o que
acontece é que cada um que chega, timidamente procura um conhecido de conhecido
e ali se enfurna, formando panelinha. Assim o festim nada tem de
confraternização, com cada grupo exatamente como era durante o ano.
Nessa tal
confraternização fazem uma brincadeira de amigo oculto, que seria uma
oportunidade de se fazer mil-e-uma brincadeiras e, claro, confraternização. Mas
na prática ninguém se diverte. Tão condicionados a racionalizar estritamente
durante o ano inteiro, cada um só escreve a quem tirou e responde a quem
escreveu. A maioria não escreve nem responde. Criatividade zero. Só se pensa no
presente e, olha a avareza de
novo aí, gente!, se fica preocupado em dar um presente bom e receber um
ruim. De modo que desperdiçam ocasião de se divertir muito porque não conseguem
se livrar da camisa-de-força pragmática racionalista tacanha de durante o ano.
Oras bolas! Longe
de ser tão infantil. Se quero tal objeto, o compro!
Outros, porque
a bebida é grátis, bebem até cair. Esses ao menos divertem aos outros.
Assim, no
dia-a-dia, são muitas as oportunidades perdidas de se fazer graça porque os
outros não encaram a vida com bom-humor. Estão sempre apressados, ranzinzas,
frustrados...
No planeta 3 o
povo evita pôr como governante um pobre porque esse pobre quereria ficar rico e
a tentação do poder seria muito grande. Mas quando põem um rico no poder esse
rico quer ficar ainda mais rico. O que esse rico fará com tanta riqueza?, se já
tem mais que o suficiente prà vida toda! É como alguém que tem 100 mil pares de
sapato e acha que usará todos. Depois os herdeiros brigam pra abocanhar tudo, e
o estado também fica de olho no que sobrou.
Ainda sem
vestígio de inteligência no planeta 3.
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