segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Um diamante chamado Verão azul
A melhor série da tevê espanhola, talvez a melhor do mundo
Pra ativar a legenda a deixar na mesma pasta do vídeo e com nome idêntico além da extensão.
Pra desativar basta a tirar da pasta ou renomear (temporariamente ou não). Qualquer caracter diferente, um simples hífen a mais no nome basta.
Tanto faz a extensão ser .srt ou .txt
A digitalização da série Verano azul devemos ao sítio chileno de Charlycueva, onde vi mas dentre tantas ficou pra mais tarde. A impressão foi de ser uma série como qualquer outra. Não é. Então outra chilena, María Paz, me recomendou ver, pois que é excelente e uma das que marcaram sua infância. Vi e gostei tanto que fui procurar legenda, pois o sotaque castelhano ibérico é muito atropelado, comendo as vogais, meio como o inglês ianque, de modo que há momento em que mesmo ouvindo 50 vezes o mesmo ponto é difícil discernir. Tanto é que até a mãe de María Paz tem dificuldade de entender o que dizem.
Então fico muito grato a María Paz pela recomendação, a Osiris pelos vídeos e ao amigo lusitano que legendou, quem teve o grande trabalho, trabalho de fã, pois se vê que foi feito de ouvido, dados os erros hilários que apontarei a diante. Tem vez que se aproxima daquela clássica gafe da legenda de O gordo e o magro, onde o magro gritou Olly!, e a legenda: Olhe!
Quem já legendou sabe o trabalhoso que é, por isso imagino que fora uma equipe de fãs. Apenas revisei e vocábulos que seriam incompreensíveis aos brasileiros.
Estranho que a série nunca tenha passado no Brasil, já que rodou o mundo, Angola e Portugal inclusive. Mas este é meio-assim um país esquisito, sem santo, sem prêmio Nobel, sem óscar, sem medalha de ouro olímpica no futebol, sem miss nude...
Já disse que as duas grandes emoções são encontrar algo muito procurado e encontrar algo que nem se sabia existir. Uma dessas descobertas maravilhosas foi as coletâneas de Agnetha em sueco e alemão. Agora em minha vida surgiu Verão azul.
Uma das coisas que mais aprecio é um conto bem contado. O conto é o gênero mais difícil e o mais importante na literatura.  Imagines o sabor de ler um conto de Poe, Lovecraft, Maupassant, Machado de Assis, Somerset Maugham, Tchekov. Que tal um enredo bem engenhoso e um final-surpresa, como nas séries de Hitchcock na tevê? Que tal um toque de fantástico, onde se fica na dúvida se foi realidade, sonho ou ilusão? Ou um drama que nos sugere formas de lidar com a dor mas ainda assim recheado de riso e muito humor? Além de tudo uma série educativa sem pieguice nem mentira? Pois ser educativo sem pieguice, irreverente sem agressão e erótico sem grosseria é possível, basta usar a inteligência.
Sem dúvida, os três roteiristas conhecem muito de conto, de literatura, pois se nota que a forma de conceber, montar, narrar e desfechar um conto está à altura dos grandes mestres da literatura mundial. Cervantes estaria orgulhoso.
Verão azul não é uma séria comercial, muito menos essa podridão de experiências interativas, tipo Lost, novela das 8 e outras tantas pragas nascidas da ganância, onde os roteiristas não sabem o que fazer com o enredo. Verão azul é uma jóia exótica, um diamante delicadamente lapidado, uma obra-prima fina e acabada, uma obra de arte repleta de poesia, beleza, encanto e ensinamento.
A trilha sonora é uma maravilha, idem as canções nos episódios. As personagens bem arranjadas. Tudo muito bem encaixado num contexto primoroso.
São 19 episódios que se desenrolam como uma noveleta ou uma série de contos. E os principais gêneros do conto estão representados: Drama, aventura, policial, ficção científica, mistério, amor, fantasma, facécia, humor, gângster, costume, ecologia, resistência passiva, crítica social.
No episódio 1, O encontro, há aventura e mistério. As crianças descobrem um barco no meio duma horta e pensam ser um disco voador. A menor fica presa dentro.
No 3, Sancho Pança, uma facécia bem no estilo de Bocácio, também um conto de amor.
No 5, Talvez, muito humor, numa comédia divertida, onde se monta, com suprema maestria, um enredo no qual as crianças, após tentativas malogradas, conseguem reagir contra a arrogância adulta.
No 7, Beatriz, meu amor, os conflitos dum amor adolescente. No final o mais encantador, inesquecível, é a extrema sensibilidade, finura e criatividade com que se trata a descoberta da primeira menstruação duma menina. As crianças menores aturdidas e as maiores fazendo a tarefa dos pais. E no final, poesia pura, literalmente.
Verão azul é digna de ser exibida, comentada e debatida em sala de aula pra todas as idades, pois é uma aula de como se conta uma estória, de como ser educativo de modo inteligente e interessante, de como se faz uma série, de como ser infantil sem baboseira, de modo que ao adulto também seja interessante, como fazia Monteiro Lobato.
No 11, As garrafas, um conto de amor e de detetive. E um esplêndido desfecho como só os grandes mestres do conto sabem fazer.
No 16, A festa de papai, se expõe o motivo dos pais não serem e não poderem ser os amigos dos filhos, o que nos leva a conclusões interessantes.
Nos episódios 17 a 19 inseri as canções nas legendas (é impressionante quanta letra errada se acha na internete).
No 6, O sorriso do arco-íris, eu não conseguia discernir o que um menino dizia sobre um cão. Apostavam. Um dizia que era golfo, vira-lata. O outro parecia dizer lucete, luzete ou lusete. Nenhum desses três vocábulos existe. Só com a legenda pude ver que era séter. Legendar é mesmo tarefa pruma equipe.
Claro que minha revisão não está perfeita, pois sempre que revimos achamos algo pra corrigir. O mais foi simplificar, eliminar redundância e superfluidade, pois legendar é a arte de resumir a mensagem ao máximo, sem perder a informação, porque quem assiste tem de ler rápido. Pôr 177 em vez de cento e setenta e sete, etc.
Nalguns casos notei que o sentido irônico duma frase não foi captado pelo legendador. Então tive de consertar.
O acidente geográfico cala está no dicionário de português como pequena enseada entre rochedos, mas optei cala Chica como enseada Pequena porque o vocábulo enseada é mais comum. Deixaria cala se fosse um texto.
Apontarei os principais erros que achei:
Traduzir copa a copo. Copa é taça, enquanto taza é xícara (chávena).
Episódio 1, O encontro, 16:37min
Dois meninos pequenos estão na praia, falando muito em caçar rã, quando passa uma garota estonteante:
Uma minhoca gótica!
Quando na verdade foi dito:
Uma rã erótica!
29:24min
Nunca comi gambas assim tão grandes
Nunca vi presas assim tão grandes
Gamba é camarão.
O dito foi colmillos (presas)
32:37min:
Uma fotografia para a prosperidade!
Quando o dito foi posteridade
Episódio 4, Eva, 08:29min:
Vinha envenenada
Vinha merendar
Episódio 5, Talvez, 08:29min:
Greve de zelo
No original disse huelga de celo, tradução literal greve de ciúme. Mas não se trata disso.  Greve de zelo, ou seja, relaxar no esmero, no zelo, no cuidado. No Brasil a expressão é operação tartaruga.
Em seguida 08:47min o menino disse Mas isso é para os aviões porque confundiu a palavra celo (ciúme) com cielo (céu)
Pra manter o trocadilho troquei por Mas isso é pros bichos.
09:01min:
Podemos fazer uma greve de braços caídos.
A expressão foi mantida pelo legendador. Não sei se em Portugal está correta.
No Brasil equivale à expressão operação braços cruzados.
Então onde o mesmo garoto disse que é uma greve de línguas caídas tive de trocar por greve de línguas cruzadas.
00:13:04,120 --> 00:13:06,400
Episódio 8, O visitante, 25:31min:
O senhor chegou. Os outros que se calem.
Na verdade foi dito:
Já está aqui o senhor. Quanto ao resto se calar.
Expressão irônica, dizendo que a visita já chegou, que quanto a tudo o mais convém manter silêncio.
Já está aqui o senhor e O senhor chegou é o mesmo, apenas que a segunda opção é mais curta e idêntica ao original.
Episódio 15, O ídolo, 25:31min:
[...] beber um copo e ficar hipnotizado por esse bicho, quando o dito foi:
[..] beber uma taça e ficar hipnotizado por esse vício
07:24min:
Isto é um pincel
Isto é uma chatice
Porque rollo, no contexto, é algo aborrecido, não um rolo, pincel pra pintar parede.
Episódio 18, Algo morre na alma, 30:47min:
26:06min:
O senhor já está melhor?
A frase tem sentido irônico. Pra captar isso melhor pôr:
Vejo que já estás bom!
30:47min:
No original o menino disse, sobre a morte, Sea como sea, es una faina.
O legendador trocou faina por grande chatice, o que pode estar correto.
Não encontrei faina nos dicionários castelhanos, nem no da real academia (existe em português, significando fardo, trabalheira, mas pode significar outra coisa em castelhano, como tantos falsos cognatos), apenas faena, vindo do catalão antigo fahena ou faena. Optei por pesar. De qualquer maneira ficou bizarro um menino tão pequeno usar um vocábulo tão inusitado em seu idioma, uma palavra portuguesa (que talvez tenha no espanhol, mas por que não está no dicionário da real academia?). Não é pelo fato do pescador o chamar de português, pois o menino é madrileno e o pescador todo forasteiro de português.
A segunda incongruência foi no episódio 7, Beatriz, meu amor, onde a turma foi sabotar a geladeira (caixa isopor com gelo) do rival, tirando as latas de coca-cola e pondo rã no lugar. Não tiraram as duas garrafas de gim!, sendo que deduziram que se há bebida alcoólica ali é porque pretende embriagar a garota, e também porque noutros episódios tentaram enganar ou convencer os adultos, pra beber álcool, e não conseguiram.
A terceira incongruência foi o pai de Quique tão furibundo no episódio 5, Talvez, reaparece bem-humorada e brincalhão no 16, A festa de papai.
Uma curiosidade: No episódio 5, Talvez, os pais insistem em perguntar a Quique (em greve de silêncio) se viu sua irmã Angelines, personagem que nunca apareceu nem foi citada, só essa menção. Talvez seja pelo cabalístico número 7: As personagens principais são 7 crianças e 2 adultos.
Mais um produto da esplêndida e saudosa década de 1980. Como crianças de hoje driblariam os adultos pra fazer uma expedição espeleológica? Com celular, GPS e o diabo-a-quatro fica difícil.
Ali vemos conceitos bem típicos da época, como os pais deixando dar uma fumadinha mas tomar cubalibre não. As crianças andando no carro livres, sem cinto de segurança. Os pais mandando o guri de 8 anos comprar vinho no supermercado. Hoje seria complicado tudo isso.
Tem coisa que se não for feita na época não dá mais. Como em Chaves, criança apanhando, o professor dando aula fumando charuto na frente das crianças, e ainda empresta um vidro com escorpião dentro pro moleque levar a casa e mostrar à mãe! Se não fosse feito na época já era!, a patrulha ideológica cairia encima.
Hoje não dá pra fazer Chaves. Não pode tirar sarro de gordo nem de mulher feia, não pode mostrar alguém dando tapa em criança. Tudo não pode. É a época mais insossa, estéril, boboca e vigiada de toda a história conhecida.
Antonio Ferrandis             -   Lima Duarte

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