Emília encontra Pêni
Um encontro entre duas
personagens prediletas
Pêni Róbinson estava sozinha de novo. Em andanças no planeta
recém descoberto, encontrou outra caverna. Pensou:
— Quê
lugar tão bonito. Me lembra a caverna de senhor Ninguém. Mas se senhor Ninguém
é uma inteligência cósmica, pode ser que o encontre novamente.
Então
se sentou numa rocha no centro do salão e falou alto:
—
Senhor Ninguém! Estás aí? Sinto tanta saudade.
A
resposta era só o eco. Então entrou noutra galeria, pra fazer o mesmo, quando
ouviu um ruído de objeto ultra-sônico perturbando o ar, como um avião-caça
cruzando de repente. Algo grande surgiu no outro extremo do salão. Era um robô
e uma moça.
Não! A
moça tinha um cabelo estranho, muito colorido. A roupa, então, em contraste
berrante. Se olharam. Os olhos gris da menina ante os mais escuros da moça,
quem sorriu.
— Oi.
Sou Pêni Róbinson. E tu? Quê espécie de alienígena és? Quê moça tão estranha!
— Oi,
Pêni. Sou Emília. Não sou alienígena, coisa nenhuma! Sou uma boneca de pano.
Pêni
riu.
— Quê
absurdo! Como pode haver uma boneca de pano que fala e anda como gente?
— Ora
essa! Se um robô bobão pode ser gente e até arranjar namorada, por quê não uma
boneca de pano? Precisavas conhecer o visconde de Sabugosa, que é um sabugo de
milho e nem por isso deixa de ser um grande sábio.
— Ha ha
ha. Um sabugo também! E sábio! Devo estar ficando maluca de tanto passear
sozinha neste planeta deserto.
— Não
está, não. Lá no sítio do Pica-pau
Amarelo, onde moro, é tudo assim mesmo.
— Em
qual planeta fica esse sítio?
— Na
Terra, ora essa! No Brasil. Á! Ainda tenho de arranjar um jeito de te levar pra
passar uma temporada lá no sítio. Tenho muitos amigos, tem muitos bichos lá,
muito lugar pra passear, as comidas gostosas de tia Anastácia, as estórias
contadas por dona Benta, dançar quadrilha, brincar com Pedrinho e Narizinho e pular
fogueira no são-joão. Mas teu nome já é estranho em inglês, acho, mas em
português e castelhano também não soa bem. A molecada pegará no pé. Como te
chamarei? Penizinha, não. Penica. Não! Peni também não. Já sei! Te chamarei de Peninha!
Puxa vida!, Peninha fica bem legal, porque Pêni é muito inglês pra meu gosto. Parece
mais nome de moeda inglesa. Imagines uma menina chamada Centavo. Não dá, né? É
muito triste tu aqui, de planeta a planeta, sempre sozinha, sem amigo pra
brincar. Eu lá, me divertindo a todo lado, fico triste me lembrando que estás
tão solitária no espaço.
— Mas
tenho família. Dois irmãos e…
Todo
mundo sabe que Emília é tagarela. Mas Pêni parecia fascinada.
— Á! Não!
Tua mãe, teu pai e o piloto sempre ocupados. Quando não estão consertando a
nave estão namorando. Tua irmã já meio adulta, sempre de olho no major Oeste.
Teu irmão, bobão, não gosta de brincar com menina. Está sempre com o robô e
doutor Esmite. Se não fosse senhor Ninguém, nunca tiveras amigos uma vez na
vida. E todo mundo veste sempre a mesma roupa cafona. Tua irmã já tem um
namoradinho. Mas e tu? Terás de te arranjar com algum alienígena!
— Hihihi.
É verdade. Ei! Mas como sabes tanto sobre mim e os outros?
— Ora!
Sei que estais perdidos no espaço. É que lá no sítio acompanhamos toda semana
vossas aventuras no espaço sideral.
—
Acompanham como?
— Tudo
começou assim: Um dos serões de dona Benta era sobre como seria o futuro. Que
nesse futuro viajaríamos a outros planetas, coisa e tal. Então visconde de
Sabugosa, não sei como, montou uma máquina retangular, cum vidro na frente,
onde vemos o futuro. E ali apareceu tua família rumo a Alfa Centauro. Ficamos fascinados
vendo todo mundo passar tanto perigo, enfrentando cada alienígena da
arca-da-velha. Precisavas ver a farra que fazemos. Damos cada grito! A maior
torcida. Até o saci aparece pra assistir. E fica tão comportado, que ninguém
acreditaria. Onde se viu saci comportado? Só lá no sítio mesmo. Mas também!
Quando grudou chiclete nas cadeiras o ameaçamos não deixar assistir mais, e
ainda o expulsar com água-benta e sal grosso. Mas, por via das dúvidas, sabes
como é, né?, vai que tivesse uma recaída, igual naquele conto do sapo com o
escorpião. Então sempre servimos um bocado de fumo, pra o deixar bem contente. E
nem te conto o tanto que xingamos doutor Esmite!
— Então
é por isso que sabes tanto sobre nós!
— Pois
é. Fiquei preocupada sobre ti. Teu irmão, o robô e doutor Esmite formam uma
panelinha masculina. As aventuras boas são sempre consigo, nunca contigo. Mas antes
só que mal acompanhada! Quê pais sensatos deixariam o filho andar o tempo todo
cum sujeito como aquele tal doutor Esmite? Até deixaram com o tal Benfeliz. Pobre
Uil! Doutor Esmite não é boa companhia
pra ti. Por quê não o deixaram congelado como no começo da viagem? Zorro, que é
valente, nobre, idealista, chamam de bandido. Enquanto aquele tipinho covarde,
ardiloso e sabotador é chamado de doutor! E aquele robô tão esquisito! Todo
redondo, mais parece um barril estufado, pesadão, com pouca mobilidade e
personalidade. Verdadeiro maria-vai-com-as-outras. Como consegue andar em
terreno acidentado com aqueles pés pesados com minúsculas rodinhas? E nem mãos
têm. Melhor está capitão Gancho, que ao menos tem a mão direita! Antes tivesse
tentáculos de polvo. Os projetistas deviam levar um cascudo! Tinha de ser um
robô com mãos, braços, pernas longas, ágil como um macaco. Mas gostei quando
deste uma dura em doutor Esmite, não o levando à caverna de senhor Ninguém. Arranjes o próprio amigo! Mostraste personalidade. Eu
disse Essa é das minhas! Tu é quem tinhas de estrelar.
Não aquele grandão. Estrelando! Bá! Estrelando, mas tudo o que faz é bancar o
mandão e umas lutas pra mostrar que é forte. Se isso é estrelar! Pode ser o astro
da espaçonave, não das aventuras. E então decidi que tinha de dar um jeito de
te visitar, pra te dar de presente um robô. Porque não é justo que Uil tenha um
robô só pra si e viva as melhores aventuras, e nada pra ti, enquanto nós mulheres
ficamos só de figurante, só pra embelezar o cenário. Não é só porque somos
burrinhas e malvadas que merecemos isso. Também não é pra tanto!
— Um
robô só pra mim?! Uau!
— Então
apelei ao visconde, que construiu o robô e até o programou. Puxa! Deu um
trabalhão! Mas como eu viria? Estamos separadas no tempo e no espaço! O
pó-de-pirlimpimpim não estava funcionando muito bem, por isso, acho. Então
apelei ao preto-velho lá do sítio, tio Barnabé, que fez uns patuás, umas rezas,
um trabalho completo. Tive até de tomar banho de gosma de umbigo-de-banana e de
leite com mel. E estava frio! Também fiz promessa na igreja. Puxa vida! Tive de
ficar um mês sem azucrinar o visconde. Não foi fácil! Até tomei banho dágua-benta.
Apelaria também à Cuca mas não me deixaram, pois não seria boa idéia. Ai! Se eu
encontrasse um gênio na garrafa! Faria três pedidos. Então me lembrei do saci
Pererê, e fui pedir ajuda, pois ficou meu amigo depois que passei a lhe dar
sempre um bocadinho de fumo, de modo que não precisei o prender na garrafa de
novo. Então vejas só o quê aconteceu: Não sei se foi o saci quem deu um jeito,
se foi força de tio Barnabé ou milagre da santa, mas aconteceu que os dois
caras perdidos no tempo caíram lá no sítio e passaram uma temporada conosco. Foi
o saci quem os levou ao visconde, claro que depois de aprontar um monte de
travessura, até os deixar arrepiados, hihihihi!, pra ver se podia os ajudar. Chegaram
com calça e camisa rasgadas de tanto rolar no chão, se espetar em espinho e
cruzar cerca de arame-farpado, e cara toda encarvoada, parecendo irmãos do saci.
Assim consegui um favorzinho do pessoal lá do túnel, pra me enviar àqui. Muito
simpática aquela doutora Ana. O túnel me transferiu, o pó-de-pirlimpimpim deu
uma turbinada na viagem, trouxe meu pé-de-coelho e rezei bastante além de me
aspergir com água-benta. E ainda tive a sorte de ficar, durante a
transferência, retida no limbo.
—
Limbo?
— O
visconde explicou, uma vez, que limbo
é um lugar intermediário. Quando se está no limbo não se está num lugar nem noutro
contíguo, mas numa fronteira indefinida.
— Puxa!
Esse visconde deve ser muito sabido. Mas por quê foi sorte parar ali?
— Foi
senhor Ninguém quem me reteve. Sabes, né? Aquele teu amigo, a inteligência
cósmica que morava na caverna, que tua mãe insistia que era apenas um amigo
imaginário. Quando criança a gente sofre com esse adultos tolos. Senhor Ninguém
é uma inteligência cósmica que estava naquela caverna quando ficou teu amigo.
Não foi embora de verdade. Vela por ti, pra que tenhas sorte na vida, sejas uma
pessoa equilibrada e feliz. Por isso me reteve no espaço, no meio de minha
viagem espaço-temporal: Pra ver se eu tinha boa intenção. Disse que ainda serás
princesa do espaço. Então me ajudou a chegar àqui. Não sem antes me recomendar
muito te divertir e contar muita fofoca. Por isso aqui estou. E pra voltar
basta uma pitada do pó-de-pirlimpimpim.
Sacou
duma abertura de sua pele de pano uma trouxinha de pano do tamanho da palma da
mão e deu a Pêni.
—
Tomes. É um presente. Pó-de-pirlimpimpim, pra usar como emergência quando
estiveres perdida ou em perigo, pra ir a qualquer lugar que se deseje. O visconde
disse uma palavra complicada: Ideopresença.
E duma
portinhola do lombo do robô sacou vários gibis.
— Estes
são gibis da Mônica. Sei que gostarás muito. É uma menina também com muita
personalidade, igual nós duas.
— Oba! E
como é dançar quadrilha? Tenho tanta vontade de dançar mas aqui não tem como.
— Hum…
Deixes eu ligar o robô, quem mostrará como é. Verás como é divertido.
Emília
apertou uns botões frontais, luzes começaram a piscar e o robô se levantou e
disse com voz metálica:
— Boa
tarde, menina Peninha. Me dás a honra desta dança?
— Puxa!
É um cavalheiro! Dancemos, senhor robô.
Na
altura da cabeça abriu uma portinhola donde se destacou um projetor que
projetou na parede um clipe duma bela quadrilha junina, pra mostrar como é.
Então
com o robô tocando uma trilha junina os três ensaiaram uns passinhos.
— Pula!
Olha a cobra! É mentira!… A chuva! É mentira!…
Peninha
se divertiu tanto que ficou cansada demais pra voltar à espaçonave Júpiter 2. O robô a carregou.
Emília
se despediu, espalhou umas pitadas de pó-de-pirlimpimpim na cabeça e voltou ao
sítio.
Coleção
de cartão-postal de Joanco
Nenhum comentário:
Postar um comentário